segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Livraria nas montanhas oferece o prazer da leitura a 3.400 m de altura


Biblioteca laFetrinelli, Mont Blanc Foto: LORENZO PASSONI / ICON DESIGN
laFetrinelli ganhou o título de livraria mais alta da Europa – muito provavelmente do mundo
A. J. Oliveira, no Estadão
Em um pequeno espaço perto do topo de uma das maiores montanhas da Europa, abriu as portas recentemente uma loja de livros diferente de qualquer outra: a laFeltrinelli 3466. Situada no interior de uma estação de teleférico a uma altitude de 3.466 metros, ganhou o título de livraria mais alta da Europa – muito provavelmente do mundo. Foi construída em Ponta Helbronner, um dos cumes que despontam do icônico Mont Blanc, que não é um único monte, mas sim um maciço de montanhas dividido pela Itália, França e Suíça.
Para chegar lá, é preciso subir por 20 minutos a bordo de uma cabine ampla e moderna, com grandes janelas que proporcionam vista panorâmica da deslumbrante natureza selvagem dos Alpes. É como o bondinho do Pão de Açúcar, só que giratório, para que todos os até 80 visitantes a bordo tenham a chance de contemplar tanto as montanhas, quanto os dois cênicos vales lá embaixo, Ferret e Veny, além da charmosa Courmayeur. A cidade, destino famoso entre alpinistas, fica a poucos quilômetros da fronteira francesa.
Durante a subida, dá para ver do alto as cabras ibex, exímias escaladores nativas daquela região. No século 19, a espécie foi implacavelmente caçada e levada à beira da extinção: estima-se que, em 1856, havia só 60 animais confinados em uma reserva. Mas projetos de preservação conseguiram elevar o número de espécimes para 40 mil e reintroduzi-los pelos Alpes. Lá em cima, fica até um pouco difícil de respirar, já que o ar é mais rarefeito.
Interior da biblioteca laFetrinelli Foto: LORENZO PASSONI / ICON DESIGN
A livraria em si tem o tamanho de um bom apartamento: 60 m². Apesar de pequena, é aconchegante e convidativa. Com catálogo de 376 títulos e 1.726 volumes, a laFeltrinelli 3466 foi inaugurada em 21 de junho, a princípio com a ideia de ser algo temporário, uma pop-up store. Duraria só até setembro, para aproveitar a alta temporada dos meses de verão. “Mas vendeu tão bem, tanto livros quanto souvenirs, que decidimos manter”, afirma Maria Lagazzi, porta-voz da Skyway Monte Bianco, empresa que opera o teleférico.
Ela conta que a visão do Mont Blanc e a sensação de estar em um lugar único no mundo incentiva os visitantes a levarem uma recordação. Toda vez que alguém compra um livro na livraria mais alta da Europa, Ylenia Mareliati, atendente de caixa, usa um carimbo especial para eternizar nas páginas a lembrança da visita. “É belo trabalhar aqui com essa vista”, ela confessa. O ponto forte são os livros de montanhismo: uma vasta seleção de títulos conta histórias de superação de alpinistas e explora a relação do ser humano com a montanha.
Impossível não se arrebatar por elevadas reflexões ao folhear um bom livro em uma das mesinhas à frente da janela. Entre uma página e outra, novas ideias vão sendo absorvidas e ganham ares sublimes ao levantar o olhar e contemplar o gelo eterno do Mont Blanc. Mesmo no verão, lá em cima fazia 3 graus — no inverno pode chegar a menos 40. Há um mirante em cima da estação para admirar a magnificência e respirar o ar puro do cume.
Por trás do projeto da livraria, há um conceito que desdobra paralelos instigantes entre viajar, ler e subir a montanha. “Os leitores, como os próprios livros, têm dentro de si o desejo extraordinário de horizontes sempre novos, e o fôlego para ir adiante e buscá-los”, lê-se na placa em uma das paredes da sala que, até junho, abrigava uma exposição de cristais extraídos do subsolo da montanha. “Este lugar é feito para eles: leitores e livros. Um lugar único e inesperado onde se pode fazer uma pausa, encontrar novas histórias, imergir na leitura com o Mont Blanc como companheiro e fonte de inspiração.”
A verdade é que a parceria se mostrou bastante proveitosa para ambas as empresas. Como uma das maiores redes de livrarias italianas, com mais de 120 lojas espalhadas pelo país, a marca atrai visitantes para o teleférico, que por sua vez oferece ao grupo Feltrinelli a chance única de estar presente no ponto mais alto da Europa Ocidental – o Monte Elbrus, com seus 5,6 km de altura, chega a ser maior que o Mont Blanc.
Mas, tecnicamente, fica no Cáucaso, em território russo, então é meio europeu, meio asiático. Outra livraria com título curioso, que está até no Guinness Book, fica a 230 metros do chão, no 60º andar de um hotel em Xangai, na China: é a mais alta dentro de um prédio.
Em termos de altura absoluta, é claro que ela não chega nem perto da nova livraria alpina. Durante sua inauguração, a presidente da Skyway Monte Bianco, Federica Bieller, ressaltou seu significado. “Graças à abertura da laFeltrinelli 3466, nosso tecnológico teleférico valoriza ainda mais a subida, tornando-a uma excursão cultural”, explicou a executiva. “A valorização da cultura de montanha, passar adiante as palavras dos autores que a amaram e a desafiaram, o Mont Blanc como cenário para fantasiar”, diz Bieller.
Em funcionamento no lado italiano da montanha desde 1947, toda a infraestrutura passou por uma gigantesca reforma entre 2011 e 2015. Com um investimento de € 110 milhões, a capacidade de visitantes por ano cresceu de 100 mil para 300 mil. As estações formam um verdadeiro complexo turístico, com diversas atrações ao longo da subida. Na estação-base, Courmayeur: The Valley (O Vale) há apenas a bilheteria e um café.
Mas, na parada intermediária, Pavillon: The Mountain (A Montanha), a 2.173 metros de altitude, o visitante se torna explorador e tem uma miríade de atividades à sua disposição. No Buffet Alpino, pode degustar os deliciosos sabores da bela região do Vale de Aosta, onde fica Courmayeur; dentro da estação tem até cinema e centro de convenções, além de uma vinícola um tanto especial – a Cave Mont Blanc.
Seu espumante Cuvée des Guides, com apenas cem garrafas produzidas ao ano, tem propriedades únicas por conta das baixas pressão atmosférica e temperatura naquela altitude. Do lado de fora, um passeio pelo Jardim Botânico Saussurea, que reúne mais de 900 espécies de plantas e flores de várias partes do mundo, oferece um vislumbre da natureza alpina, com uma profusão de insetos voando, pulando e zunindo por toda parte.
Montanhistas podem ir e vir como quiserem pelo ambiente ao redor, fazendo trilhas nos meses mais quentes, mas recomenda-se sempre o acompanhamento de guias. “A montanha é livre, nós não freamos ninguém”, afirma Lagazzi. O mesmo vale para esquiadores, que podem descer o Mont Blanc no inverno, mesmo sem grandes estruturas para a prática. É preciso ter experiência. “Não é como esquiar em pista”, ela diz. Já quando chega na estação final, Punta Helbronner: The Sky (O Céu), o explorador vira peregrino.
Aqui, no ponto mais alto da Europa, ou em outra perspectiva, o ponto mais baixo do céu, além da laFeltrinelli 3466 e do observatório 360 graus, é possível fazer uma leve refeição ou tomar um café no bistrô panorâmico, e até atravessar a vertiginosa passarela toda de vidro SkyVertigo. A sensação é de estar caminhando pelo céu sobre o gelo eterno do cume lá embaixo. Àquela altitude, o clima muda rápido: Lagazzi dá a dica de fazer a subida de manhã, quando a visibilidade é melhor. Tocar o céu e regressar ao vale é um pouco como começar e concluir a leitura de um bom livro – não se é mais o mesmo no final.
Por Cristina Danuta/www.livrosepessoas.com
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sábado, 21 de setembro de 2019

A importância da figura paterna na criação dos autistas

Young Boy Studying At Desk In Bedroom In Evening
O envolvimento e a participação do pai na criação de crianças e jovens com autismo é tão fundamental quanto das mães. Infelizmente, não é isso que acontece em todos os casos. É bastante comum que apenas as mães fiquem responsáveis pelos cuidados das pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) por diferentes razões.
Sabe-se que cuidar de uma criança autista é uma tarefa árdua para alguns pais. E que o amor e o afeto do pai e da mãe afetam igualmente o comportamento da criança, a autoestima, a estabilidade emocional e a saúde mental. A presença da figura paterna beneficia as crianças e ajuda também a desenvolver suas habilidades cognitivas, sociais e emocionais à medida que essas crianças crescem.
Os pais ficam responsáveis por cuidar, compartilhar momentos de atividades e brincadeiras, assim como têm responsabilidades de garantir que a criança ou jovem com o TEA tenham todos os cuidados e recursos para se desenvolver.
Pesquisadores afirmam que os pais da criança com TEA ao se confrontarem com o diagnóstico podem experimentar um sentimento de perda da criança idealizada e vivenciar um processo de luto do filho “perdido”. Por essa razão, os pais podem encontrar uma dificuldade para estabelecer vínculos afetivos com a criança nos primeiros anos. Alguns pais podem precisar de ajuda psicológica para lidar com a situação e superar essa dificuldade.
Um “pai engajado” é definido como aquele que se comporta de forma responsável com seu filho, é emocionalmente engajado e fisicamente acessível, fornece apoio material para sustentar as necessidades da criança, está envolvido no cuidado das crianças e exerce influência nas decisões de criação dos filhos.

Desenvolvimento infantil e a participação dos pais

A relação entre pai e filho pode ser tão importante quanto o relacionamento da criança com a mãe em estágios iniciais de desenvolvimento – o envolvimento do pai está relacionado a resultados positivos em bebês, como melhora no ganho de peso em bebês prematuros e melhores taxas de amamentação. Além disso, mães e pais têm diferentes estilos de brincar e se comunicar com as crianças e desempenham papéis únicos, mas vitais no desenvolvimento infantil. Alguns exemplos:
– Os pais promovem um comportamento mais exploratório e independente por parte de seus filhos pequenos. Eles ajudam nas brincadeiras mais físicas e estimulantes do que a maioria das mães;
– Ao falar com crianças pequenas, as mães simplificam suas palavras e falam no mesmo nível da criança. Os pais falam de outra forma e desafiam a competência linguística da criança.
– Em questão de disciplina, é comum que os pais sejam mais rigorosos e exigentes, o que pode ser mais efetivo nas intervenções terapêuticas.

Participação em tratamentos e intervenções terapêuticas

Para que o autista se desenvolva e tenha menos sintomas que impactem a sua vida, algumas intervenções terapêuticas são indicadas. E para ter sucesso, elas englobam tanto a família quanto a escola. Boa parte do tratamento se estende para a própria casa do autista e nesse momento a participação dos pais é fundamental para ter resultados positivos. O afeto e a proximidade dos pais são imprescindíveis para a criança se sentir acolhida e segura.
Por isso, é fundamental que os pais estejam presentes em todos os momentos da vida do filho com o TEA. É importante participar das consultas com pediatras, psicopedagogos e reuniões escolares para apoiar as mães e também entender mais o que acontece com o filho com autismo. Ter um pai por perto ajuda à criança autista a ser mais segura, equilibrada e evoluir com os tratamentos indicados.
Por Dra. Fabiele Russo/NeuroConecta